Exame Velocidade de Hemossedimentação (VHS) para Inflamação crônica




A Velocidade de Hemossedimentação (VHS), também conhecida como taxa de sedimentação de eritrócitos, é um exame laboratorial amplamente utilizado para avaliar processos inflamatórios, particularmente inflamação crônica. Embora inespecífico, o teste é valioso por sua simplicidade, baixo custo e capacidade de detectar alterações sistêmicas associadas a doenças como artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico e infecções crônicas. Este estudo revisa as bases teóricas e práticas da VHS, abordando sua fisiologia, aplicações clínicas, limitações e relevância no diagnóstico e monitoramento de inflamação crônica, com base em evidências científicas recentes.

Fisiologia da Velocidade de Hemossedimentação

A VHS mede a velocidade com que os eritrócitos sedimentam em um tubo vertical ao longo de uma hora, expressa em milímetros por hora (mm/h). O processo é influenciado pela interação entre eritrócitos e proteínas plasmáticas, especialmente fibrinogênio, imunoglobulinas e outras proteínas de fase aguda, que aumentam durante estados inflamatórios. Essas proteínas reduzem a repulsão eletrostática entre os eritrócitos, promovendo a formação de agregados (rouleaux) que sedimentam mais rapidamente. Valores normais variam com idade e sexo: homens geralmente apresentam VHS <15 mm/h e mulheres <20 mm/h, com aumentos fisiológicos em idosos (até 40 mm/h em pessoas acima de 60 anos).

A VHS é um marcador indireto de inflamação, respondendo lentamente a estímulos inflamatórios em comparação com a Proteína C Reativa (PCR). Seu pico ocorre dias após o início do processo inflamatório, e a normalização pode levar semanas, o que a torna particularmente útil para avaliar condições crônicas.

Aplicações Clínicas da VHS

A VHS é empregada principalmente no diagnóstico e monitoramento de doenças inflamatórias crônicas, com as seguintes aplicações:

Diagnóstico de Doenças Reumatológicas

Na artrite reumatoide e no lúpus eritematoso sistêmico, a VHS é usada para avaliar a atividade inflamatória. Níveis elevados (>30 mm/h) correlacionam-se com exacerbações da doença, enquanto valores normais sugerem remissão. Em polimialgia reumática, a VHS frequentemente excede 50 mm/h, sendo um critério diagnóstico essencial, conforme diretrizes do Colégio Americano de Reumatologia.

Detecção de Infecções Crônicas

A VHS é útil na suspeita de infecções crônicas, como tuberculose e endocardite bacteriana. Em pacientes com febre de origem desconhecida, uma VHS elevada (>100 mm/h) pode indicar infecções subagudas, doenças reumatológicas ou até mesmo neoplasias, como linfomas. Estudos, como o de Cunha et al. (2019), mostram que a VHS tem sensibilidade de 70-80% para detectar processos inflamatórios crônicos, embora sua especificidade seja limitada.

Monitoramento de Resposta Terapêutica

Na prática clínica, a VHS é usada para avaliar a eficácia de tratamentos em doenças inflamatórias. Por exemplo, em arterite temporal, a redução da VHS após corticoterapia indica controle da inflamação. A persistência de valores elevados pode sugerir resistência ao tratamento ou complicações.

Métodos de Dosagem

O método padrão para VHS é o de Westergren, que utiliza sangue anticoagulado com citrato de sódio, colocado em um tubo vertical de 200 mm. A leitura é feita após uma hora, medindo a distância entre o topo da coluna de plasma e o nível superior dos eritrócitos. Métodos automatizados, como os baseados em infravermelho ou microsedimentação, oferecem maior rapidez e reprodutibilidade, mas exigem validação em relação ao método de Westergren. Fatores como temperatura, vibrações e inclinação do tubo podem afetar os resultados, exigindo controle rigoroso durante a coleta e análise.

Limitações da VHS

A principal limitação da VHS é sua baixa especificidade. Elevações ocorrem em diversas condições, incluindo anemia, hipergamaglobulinemia, gravidez, obesidade e malignidades, dificultando a identificação da causa subjacente. Falsos negativos também são possíveis em inflamações localizadas ou em pacientes com doenças crônicas que não alteram significativamente as proteínas de fase aguda. Além disso, a VHS é menos sensível que a PCR para detectar mudanças agudas, sendo menos útil em infecções de início rápido. A combinação com outros marcadores, como PCR e contagem de leucócitos, aumenta a acurácia diagnóstica.

Relevância e Perspectivas

A VHS permanece relevante na prática clínica devido à sua acessibilidade e utilidade em contextos de baixa tecnologia, especialmente em países em desenvolvimento. Em doenças reumatológicas e infecções crônicas, ela oferece uma visão complementar à PCR, sendo particularmente eficaz para monitoramento a longo prazo. Sua simplicidade permite integração em algoritmos diagnósticos, como na avaliação de febre de origem desconhecida, onde valores extremos orientam a investigação de causas graves.

Avanços recentes incluem o desenvolvimento de métodos automatizados que reduzem erros técnicos e o uso de inteligência artificial para integrar a VHS com outros biomarcadores, melhorando a interpretação em cenários complexos. Pesquisas futuras devem focar na padronização de valores de referência ajustados para idade, sexo e etnia, além de explorar combinações de marcadores que aumentem a especificidade diagnóstica.

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A Velocidade de Hemossedimentação é um exame clássico e acessível para avaliar inflamação crônica, com aplicações consolidadas em reumatologia, infectologia e oncologia. Apesar de sua baixa especificidade, sua capacidade de detectar e monitorar processos inflamatórios a torna indispensável, especialmente em contextos de recursos limitados. A integração com outros biomarcadores e o avanço tecnológico prometem otimizar sua utilidade, consolidando a VHS como uma ferramenta complementar na medicina moderna. Estratégias que promovam sua correta interpretação e uso racional são essenciais para maximizar seu impacto clínico.

Referências

Cunha BA, et al. Fever of unknown origin: a clinical approach. Am J Med. 2019;132(10):1138-1145.

Brigden ML. Clinical utility of the erythrocyte sedimentation rate. Am Fam Physician. 1999;60(5):1443-1450.

Harrison M. Erythrocyte sedimentation rate and C-reactive protein. Aust Prescr. 2015;38(3):93-94.


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