Um pouco sobre o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Psoríase
Um pouco sobre o Protocolo Clínico e
Diretrizes Terapêuticas da Psoríase
A psoríase é uma doença inflamatória crônica, não contagiosa, de caráter sistêmico, que afeta predominantemente a pele, unhas e, em alguns casos, articulações, com impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes.
A psoríase acomete cerca de 2% da população mundial, com prevalência no Brasil variando de 1,31% a 2,5%, conforme estudos populacionais. É uma condição autoimune, caracterizada por hiperproliferação de queratinócitos e infiltração de células inflamatórias, como linfócitos T e macrófagos, mediada por citocinas pró-inflamatórias, incluindo fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), interleucinas (IL) 17 e 23, e interferon-gama. A predisposição genética desempenha um papel crucial, com herança poligênica e associação com antígenos leucocitários humanos (HLA), especialmente HLA-Cw6. Parentes de primeiro grau têm risco até 10 vezes maior de desenvolver a doença, com probabilidade de 20% se um genitor for afetado e 75% se ambos forem.
As manifestações clínicas da psoríase são variáveis, incluindo formas em placas (vulgar), gutata, pustulosa, eritrodérmica, invertida e ungueal, sendo a psoríase em placas a mais comum (75-90%). As lesões cutâneas apresentam-se como placas eritemato-escamosas, com bordas bem definidas e escamas branco-prateadas, localizadas preferencialmente em superfícies extensoras (joelhos, cotovelos), couro cabeludo e região lombossacra. A psoríase pode surgir em qualquer idade, com picos de incidência entre 20-40 anos e após os 50 anos, afetando ambos os sexos igualmente. Fatores desencadeantes incluem infecções (como estreptococos), estresse, medicamentos (beta-bloqueadores, lítio) e condições climáticas frias.
A psoríase está associada a comorbidades significativas, como obesidade, diabetes mellitus, hipertensão arterial, síndrome metabólica, depressão e alcoolismo, que elevam a morbimortalidade. Cerca de 20-30% dos pacientes desenvolvem artrite psoriásica, uma artropatia inflamatória com padrão proliferativo, geralmente fator reumatoide negativo, que possui protocolo específico no SUS. O impacto na qualidade de vida é considerável, comparável ao de doenças como câncer ou diabetes, com prejuízo físico, mental e social, especialmente em áreas visíveis ou funcionais, como mãos e pés. Estudos apontam que até 71% dos pacientes relatam impacto na vida sexual, e a prevalência de transtornos psiquiátricos, como ansiedade e depressão, é elevada.
O diagnóstico da psoríase é primariamente clínico, baseado na identificação de lesões características. Em casos atípicos, a biópsia de pele pode ser necessária, revelando hiperqueratose, paraceratose, acantose e infiltrado inflamatório com microabcessos de Munro. O diagnóstico diferencial inclui eczemas, micoses, lúpus cutâneo, líquen plano e sífilis secundária. Ferramentas como o Psoriasis Area and Severity Index (PASI) avaliam a gravidade da doença, considerando eritema, infiltração, descamação e extensão das lesões, com escores de 0 a 72. Um PASI ≤10 indica psoríase leve, enquanto >10 sugere moderada a grave. O Dermatology Life Quality Index (DLQI) mede o impacto na qualidade de vida, com escores de 0 a 30, sendo valores >10 indicativos de comprometimento significativo.
Os critérios de inclusão no PCDT abrangem pacientes com psoríase cutânea leve (PASI ≤10, acometimento ≤10% da superfície corporal ou DLQI ≤10) ou moderada a grave (PASI >10, acometimento >10%, DLQI >10, ou lesões resistentes em áreas especiais, como unhas, palmo-plantar, genitália ou couro cabeludo). Pacientes com artrite psoriásica ou sem diagnóstico confirmado de psoríase são excluídos. Contraindicações absolutas incluem infecções ativas, tuberculose, insuficiência hepática ou renal graves, gestação/lactação (para alguns medicamentos) e hipersensibilidade aos fármacos.
O tratamento da psoríase visa períodos prolongados de remissão, sendo individualizado conforme a gravidade. Para casos leves, tratamentos tópicos são a base, incluindo corticosteroides (clobetasol para lesões extensas, dexametasona para áreas sensíveis), calcipotriol (análogos da vitamina D), emolientes e queratolíticos (ácido salicílico). Esses tratamentos são seguros e eficazes, com estudos mostrando redução de até 71,6% no PASI em 4 semanas com a combinação calcipotriol e corticosteroides. Efeitos adversos, como atrofia cutânea e taquifilaxia, são minimizados com uso por períodos restritos (15-60 dias).
Na psoríase moderada a grave, além dos tratamentos tópicos, são indicados tratamentos sistêmicos, como fototerapia (UVB de faixa estreita ou PUVA), medicamentos orais (acitretina, metotrexato, ciclosporina) e biológicos (adalimumabe, etanercepte, risanquizumabe, secuquinumabe, ustequinumabe). A fototerapia UVB de faixa estreita é eficaz, com remissão histológica em até 88% dos casos, sendo segura para gestantes e crianças. A PUVA, mais eficaz para placas espessas e lesões ungueais, apresenta maior risco de fotocarcinogênese, sendo reservada para falhas à UVB.
A acitretina é indicada para psoríase pustulosa e palmo-plantar, com eficácia potencializada quando associada à fototerapia. O metotrexato é efetivo em formas gutata e em placas, mas é contraindicado na gestação devido à teratogenicidade. A ciclosporina, útil em psoríase eritrodérmica, tem uso limitado por nefrotoxicidade e risco de hipertensão. Estudos mostram que a combinação de acitretina com UVB reduz doses e toxicidade, enquanto a associação com ciclosporina é evitada devido ao risco de câncer cutâneo.
Os biológicos revolucionaram o tratamento da psoríase moderada a grave, com alta eficácia. Inibidores de TNF-α (adalimumabe, etanercepte) e de IL-17/23 (risanquizumabe, secuquinumabe, ustequinumabe) alcançam PASI 75 em 60-80% dos pacientes em 12-16 semanas. O ixekizumabe, embora não incluído no PCDT, demonstrou superioridade em ensaios clínicos (RR 32,45 para PASI 90), mas com maior risco de eventos adversos. O ustequinumabe apresenta bom equilíbrio entre eficácia e segurança, com menor risco de infecções graves. A escolha do biológico considera comorbidades, como tuberculose latente, que exige rastreamento prévio com prova tuberculínica ou IGRA.
O monitoramento de pacientes em uso de biológicos inclui avaliação periódica para infecções, com suspensão temporária em casos de eventos infecciosos graves. Gestantes devem evitar biológicos, com contracepção recomendada até 5 meses após adalimumabe e 15 semanas após ustequinumabe. Crianças com psoríase grave podem usar acitretina, metotrexato ou ciclosporina, com etanercepte como opção em falhas terapêuticas, conforme recomendação da Conitec.
A psoríase tem impacto significativo no SUS, com custos elevados para tratamentos biológicos, mas justificados pela redução da morbidade e melhora na qualidade de vida. A atenção primária desempenha papel crucial na identificação precoce e encaminhamento para centros especializados, otimizando desfechos. A integração multidisciplinar, envolvendo dermatologistas, reumatologistas e psicólogos, é essencial para o manejo integral.
Os desafios incluem a capacitação de profissionais, acesso a centros de fototerapia e adesão ao protocolo. A educação de pacientes sobre fatores desencadeantes e comorbidades é fundamental para a prevenção de recidivas. A consulta pública, etapa do processo de elaboração do PCDT, assegura transparência e participação social.
Portando o PCDT de 2021 para psoríase oferece diretrizes robustas, baseadas em evidências, para o manejo no SUS. A abordagem escalonada, com tratamentos tópicos, fototerapia e sistêmicos, visa maximizar a remissão e minimizar efeitos adversos, considerando as particularidades do contexto brasileiro. A incorporação de biológicos amplia as opções terapêuticas, mas exige rigoroso monitoramento para garantir segurança e eficácia.
Comentários
Postar um comentário